holofote • gustavo aragoni

Por Sylvia Werneck

Publicado em 10 de Julho de 2021

“Sou um apanhador de desperdícios:

Amo os restos

como as boas moscas”

Manoel de Barros

A palavra desenho, no processo criativo de Gustavo Aragoni, deve ser usada para descrever aquilo que extrapola os limites da concepção tradicional. Linha, plano e superfície costumam invadir o espaço e ganhar volume em esculturas improváveis e ações performáticas. Também o gesto, aqui, vai além da mão ou mesmo do braço – na verdade, todo o corpo do artista participa destes traçados que, por vezes, se aproximam de movimentos executados como que em estado de transe, num imbricamento com os mais prosaicos materiais, recolhidos aleatoriamente, com os quais Gustavo estabelece uma relação de entrega total ao momento. A própria substância aderida a outra - à qual chamamos de “figura” - pode surgir não do lápis ou do carvão, mas do arranhar o papel, do pisar a poeira ou do esparramar a farinha de trigo. Como escolha, a composição resulta de uma sequência de atos não programados e está fadada a se transformar a qualquer instante.

Trata-se de uma prática, mais que de um método, que recusa a estabilidade, escapa das definições e subverte hierarquias. Nos desenhos onde o preto se impõe, é a luz que vaza por entre os riscos que emerge. Nas instalações, são as sobras da experiência que povoam o espaço. A paleta do artista se compõe primordialmente do preto (ausência total de luz) e do branco (saturação total), e acolhe, por vezes, cinzas e ocres esmaecidos. Esta parcimônia cromática mira o essencial. É preciso pausar o olhar e despir a mente para captar as miudezas, os vazios entre as coisas – é neste intervalo indefinido que mora o ato criador.

• Exercícios para decompor um corpo, 2020. Fotografia

• In-determinável, 2020. Ocupação Ed Vera

• Sem título, 2019. Jornal, tinta e terra

• Sem título, 2020. Série Projeto Bandeira. Incisões em tecido

• Sem título, 2018. Carvão, pastel e massa acrílica s/ papel

• Sem título, 2018. Óleo, carvão e pastel s/ papel

• Trabalho Decente, 2020. Desenho com transferência de óleo, pregos e incisões em bloco de cartão de ponto

• Realidades transitórias, 2021. Ocupação Ed New Castle

• Re-flexões, 2020. Incisões em livro



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